quarta-feira, 7 de outubro de 2020

1ª edição das Voltas do Impossível 2020 - 2ª parte

Continuação...


"Está na hora, não há volta a dar"

Fiz uma última verificação para ver se não me faltava nada, memorizei o número do dorsal (118) para ir recolhendo as guias, máscara no focinho e entrei na arena. Havia marcas no chão para ficarmos todos afastados... Eu optei por ir lá para trás, como faço quase sempre...

Junto à placa que imortalizaria os eventuais "Pilhas" que conseguissem dar as 5 voltas dentro do tempo limite. Foto: Filipe
 

Na Arena estavam expostas as matrículas entregues pelos participantes. Foto: Filipe.


Partida! Com a lanterna acesa. Foto: Filipe.

Sabíamos que a partida seria às 7h30 em ponto! Agradeci mais uma vez para mim mesmo o Moutinho não se ter lembrado de dar a partida às 2 ou 3 da manhã... Iria ser o terror, já vão perceber porquê...

Acende-se a lanterna e aí vão eles! Não éramos muitos, pelo que ouvi dizer, uns 35... Os primeiros depressa deixei de os ver. Ali fiquei na cauda do pelotão durante as primeiras centenas de metros...

Subimos pelo meio da aldeia de Rio de Frades, apanhamos um troço de estrada e ao fim do primeiro km estávamos a entrar nos trilhos propriamente ditos.

Seguia atrás do Miguel Baptista... Subíamos ligeiramente, mas dava para dar um trote de vez em quando... Passei o Miguel e segui no meu ritmo... Antes dos 2km virámos à esquerda e a inclinação aumentou substancialmente... Sentia-me bem, soltinho, levezinho... Sem qualquer dificuldade na navegação do GPS... Naturalmente fui ultrapassando alguns atletas...

Até aos 5km era sempre a subir! Tínhamos partido aos 320m de altitude e subiríamos até aos 960m +/-. O Moutinho fez o favor de nos abrir grande parte do trilho à força de roçadora, por isso quase nem era preciso GPS... Além de ver onde metíamos os pés, só tínhamos de nos preocupar em apanhar as duas primeiras guias que estavam entre o 4º e o 5º km, o que não foi difícil, porque as caixas estavam bem visíveis.

As sensações eram boas! O sol levanta-se por trás da montanha, havia algumas nuvens no ar, a temperatura era fresca, o ar era puro e aquele silêncio não tinha preço... A meio da subida temos um troço plano, em que seguimos por uma crista, talvez com uns 10m de largura... Olhamos para um lado, um vazio de 500m de profundidade, do outro lado idêntico... As encostas em redor são íngremes e agrestes! Mas não há grande tempo para apreciar as vistas...

Até que chegamos à primeira caixa, ainda vamos alguns atletas juntos, fazemos fila para retirar a guia e seguimos. Umas centenas de metros mais à frente a segunda... Siga!

 

1ª Caixa com a 1ª guia. Foto: José Carlos Madureira.


Aproveitar para descansar um pouco na fila. Foto: José Carlos Madureira.

 
 
Tudo à procura do dito papel. Foto: José Carlos Madureira.

Apanhamos a estrada, terminou a primeira subida! Sabia pelo gráfico da altimetria que seriam 3 grandes subidas... a primeira estava feita! 5km em 50 minutos... Parece lento, mas acreditem que não foi nada mau!

Entramos novamente nos trilhos, um caminho entre muros de pedra, com o piso cheio de pedra também... Mas como estava fresco e a agilidade ainda estava no máximo fiz aquilo tudo a correr... pelo caminho apanhei a 3ª guia.

Fomos descendo, entretanto arranjei companhia de um atleta com um ritmo idêntico... Chegamos ao Rio (de Frades) onde estava a 4ª caixa. Apanhei a guia, olhei à volta... "Mas isto é para onde?" Olhei para o GPS, como estava parado e metido num buraco jeitoso também ele estava meio marado... Só havia uma hipótese, atravessar o rio e logo se via...

Assim foi. Passamos o rio tentando não molhar muito os pés e logo percebi que era para seguir por ali abaixo junto a uma espécie de levada... Chegamos à parte perigosa que o Moutinho tinha falado, tipo via ferrata, havia uns cabos de aço na rocha e tínhamos que seguir com cuidado a ver bem onde púnhamos os pés! É que uma queda aqui era um trambolhão de 20 ou 30 metros até ao rio.

Passamos a parte perigosa e seguimos num trilho bastante agradável, estreitinho, mas plano e já sem perigo, até apanharmos novamente estrada e chegarmos à aldeia de Tebilhão, que já conhecia do UTSF, mas por um acesso diferente.

Em Tebilhão surgem novamente dúvidas na navegação... "Será por aqui? Será por ali?" Sabíamos mais ou menos a direção a seguir, por isso era ir descendo e se saíssemos do caminho o GPS logo avisaria... O meu medo era seguir um caminho paralelo e diferente do estipulado e falhar alguma caixa, mas como a caixa seguinte estava só depois da aldeia, não havia esse perigo.

Saímos da aldeia e descemos por entre umas hortas, novamente em direção a um riacho num trilho que me pareceu familiar das vezes que fiz o UTSF. Aí junto ao rio estava a 5ª caixa! Não havia como falhar!

Seguia-se a aldeia de Cabreiros, onde o track fazia "uma agulha" e mandava-nos para trás quase pelo mesmo caminho... O pior foi descobrir para onde é que ele nos mandava e qual o caminho a seguir... Fui pela lógica, subi um muro, atalhei por uma ribanceira, dei a volta à capela e deparei-me com outro muro e mais uns pequenos campos de cultivo... Tinha que ser por ali! Dei um assobio para avisar o meu colega que já tinha encontrado o trilho e segui... Nunca mais o vi! Só o voltaria a ver no final desta primeira volta!

Aqui o percurso começava a ser dúbio... Já não era aquele trilho limpinho que o Moutinho tinha preparado... Já andávamos no meio de campos, árvores, açudes, trilhos estreitos entre muros... Não havia apenas um caminho possível, haviam sempre vários... E eu ia tentando escolher o mais lógico, sempre seguindo a linha orientadora do GPS...

Até que vejo um atleta uns metros à frente, era o Paulo Correia, também andava meio às aranhas... Mas o que é certo é que foi graças a ele que não falhei a 6ª caixa! Houve outros que não tiveram a mesma sorte e tiveram que voltar para trás! Lá conseguimos chegar à estrada, saíndo ligeiramente do track, mas a caixa estava feita e era o que interessava... De qualquer das maneiras, memorizei logo por onde seria o caminho certo, para não me enganar na 2ª volta!

Seguia agora com o Paulo, entramos logo de seguida nos trilhos e continuamos a subir! Estávamos a fazer a 2ª grande subida da prova! Uns caminhos sem grande dificuldade de navegação, mas mesmo assim ainda andámos lá no meio de um matagal e começava o festival de acupunctura! Bem dizia o Moutinho que o melhor era levarmos calças... Eu levava corsários, mas não era suficiente... A esta altitude predominavam as silvas, os tojos e outros arbustos nada agradáveis ao toque!

Lá encontramos a 7ª caixa! Recolhemos a guia e logo de seguida seguimos pelo caminho errado! Depressa voltamos para trás! Demos de caras com o Miguel Baptista e com outro atleta, o Adriano, que mais tarde descobri que tem os joelhos do Mantorras!

Quatro cabeças pensam melhor que uma! E com 4 gajos a olhar cada um para o seu GPS, lá conseguimos dar com o trilho certo... Estão a ver o que é um trilho com 20 a 30cm de  largura, com o chão limpo, mas da cintura para cima todo tapado com giestas e silvas e sei lá mais o quê? Era por aí que tínhamos que seguir! O problema é que havia sempre 2 ou 3 opções de caminhos diferentes... Ora seguia eu à frente, chamava os meus colegas, atravessávamos aqueles 10 ou 20 metros e de seguida ficávamos na dúvida outra vez... Depois seguia outro, a abrir caminho por entre as giestas e silvas tentando não fugir muito do track... Havia partes em que baixava a cabeça ao nível dos joelhos e seguia quase de gatas por ali acima... Porque a parte de baixo junto ao chão tinha menos mato que junto ao tronco e cabeça! Um martírio... Só se ouvia o pessoal aos "Ais! Uis!"! De vez em quando lá saía um "F*da-se!".

Até que o caminho começou a abrir um pouco mais e demos de caras com a 8ª caixa! Eu diria que foi sorte! Bastava termos ido um pouco mais ao lado e nem a víamos! Estávamos com 11km e pouco, aos 900m de altitude e 1h45 de prova! Ou seja, sensivelmente a meio da volta!

Continuamos a subir, mas agora num estradão, onde deu para correr um bocadito, comer qualquer coisa e vestir o corta vento que cá em cima estava mais vento!

Depressa terminou o estradão e mais um troço de matagal para atravessar, numa zona mineira abandonada! Mais uns arranhões na pintura!

Chegamos à zona das eólicas (1100m) onde eu pensava que o Moutinho nos ia mandar pelo estradão, tipo troço de ligação com outro trilho... Qual quê! Vais aqui por cima destas pedras que são muito bonitas! E atenção para não falhares a caixa com a 9ª guia! Conclusão: quase 10 minutos para fazer 700m! Vá lá que não falhamos a caixa!

A meteorologia aqui em cima não perdoava! Estávamos num planalto, bastante expostos. A temperatura devia rondar os 10º ou menos, não sei... Havia algum vento e uma chuva miudinha! Agradeci a mim mesmo o facto de ter trazido uma camisola térmica de manga comprida por baixo da t-shirt!

Lá fizemos um bocadito de estradão e virámos para os trilhos novamente! Logo ali estava a 10ª caixa, numa zona tipo pântano, onde haviam muitas poças de água!

Seguimos os 4! Um singletrack engraçado, ainda no planalto, girámos à esquerda e entramos num trilho que nos levaria à aldeia do Candal! Era um caminho murado, tipo calçada com grandes pedras, onde dava para perceber que já lá tinham passado carros de boi, carroças, ou coisa parecida... mas neste momento estava já com muitas ervas e apenas dava para passar uma pessoa. De vez em quando era atravessado por cursos de água que escorriam pelo caminho e desciam encosta abaixo...

O Paulo seguia à frente em alta velocidade e apesar de ser o mais velho, foi o que se desenrascou melhor na descida! Uns 20m atrás vinha o Miguel e eu... O Adriano, talvez pelos joelhos de Mantorras, foi ficando para trás...

Quase no final da descida, mesmo antes da aldeia, atravessamos uma estrada, entramos noutro caminho e novamente  haviam duas hipóteses: uma viragem à direita que parecia a mais lógica,  e outra era seguir em frente por um caminho mais tapado... Convenci o Paulo e o Miguel que era para a direita! Fizemos uns 100m e fomos desembocar num caminho de empedrado, onde vinha também ter a outra hipótese que tínhamos visto. Estranhei e disse-lhes "Esperem que vou aqui verificar se não está aqui a caixa." E não é que estava mesmo?!

Reunimos novamente com o Adriano que por sinal tinha tomado a opção certa! Pelo menos não falhamos a caixa... mas esta foi por pouco! Seguimos.

Continuamos a descer, atravessando a aldeia... mas disse logo aos meus colegas "Epá, vocês vão olhando para o GPS, vão confirmando, porque às vezes um gajo pode-se enganar..." E Apesar de grande parte do percurso seguir trilhos lógicos, noutras partes, bastava uma distração, ou um excesso de confiança e já estavas fora do trilho, ou passavas e nem vias a caixa...

Enquanto saíamos da aldeia do Candal e começávamos novamente a subir, já ia sempre na dúvida... Aquele engano tinha-me matado um bocado a confiança na minha navegação! Já só faltavam 2 guias e não era altura para enganos!

Estávamos na terceira e última grande subida! Era a mais curta das 3, dos 680m aos 870m! Depois de sairmos da aldeia já não havia dúvidas na navegação... Era para subir por um pequeno corta-fogo até uma cruz lá no alto da serra!

Lá fomos indo, com calma, na conversa... Lá em cima junto à cruz estava a 12ª caixa! Tínhamos umas vistas desafogadas em redor e sabíamos que agora era sempre a descer novamente até Rio de Frades... Estávamos com sensivelmente 18km e 2h50 decorridas.

Cá em cima estava novamente frio e vento! Aproveitei para vestir novamente o corta-vento, que entretanto tinha tirado. O trilho agora, apesar de não apresentar grande dificuldade em termos de altimetria, era bastante técnico... A navegção também não era muito complicada, mas havia que ir sempre a olhar para o relógio para não perder o rumo...

Alguma carqueija para evitar, muitas pedras de xisto que pareciam facas com o gume virado para cima... Havia que escolher muito bem o sítio onde colocávamos os pés! Íamos os 4 em fila indiana...O Miguel, o Paulo, eu e o Adriano...

Acredito que naquela altura íamos os 4 a desfrutar mesmo daquilo! Até que... Paff! O Miguel para-se no meio do trilho, larga uns impropérios, levanta o pé esquerdo do chão... Coxeia... e ao mesmo tempo que se vira para trás para se sentar eu só pensava... "Espero que não seja grave! Espero que não seja grave!"

Mas era... O Miguel tinha batido com o joelho esquerdo numa lâmina de rocha que estava meia atravessada no trilho e tinha um corte talvez de uns 4 ou 5cm...


Continua...

3 comentários:

  1. mas... mas... ??? Atão ... vais demorar muito???

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  2. Calma caraças! Já vai... É para criar suspense... aprendi com um gajo noutro blog! De vezem quando deixo-me dormir! :D

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    1. esse gajo é tipo "olha para o que digo e não olhes para o que faço" :P

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